terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Temporada de Fórmula 1 de 1981

A temporada de 1981 começou com a continuidade da briga entre a FISA (Federação Internacional de Automobilismo Esportivo) e a FOCA (Associação dos Construtores da Fórmula 1). A questão que vinha causando mais polêmica era a da proibição, pela FISA, da utilização das minissaias laterais nos carros — equipamento fundamental para o efeito-solo —, por motivos de segurança. Negavam-se a aceitar a mudança do regulamento as equipes Brabham, Lotus, Williams, McLaren, Tyrrell, March, Fittipaldi, Arrows, Ensign, ATS e Theodore, unidas em nome da FOCA. Apoiando a FISA o chamado bloco dos "legalistas", formado pelas equipes Ferrari, Alfa Romeo e Renault, poderosas escuderias oficiais de indústrias automobilísticas, e as particulares Ligier e Osella.

Muitas reuniões, acordos sendo feitos e desfeitos, discussões acaloradas. O prestígio da mais importante categoria do automobilismo mundial ficou seriamente abalado. A Fórmula 1 estava dividida e gerou um clima de incertezas. Em meio a essa confusão a Goodyear, maior fornecedora de pneus da categoria, decidiu se retirar, sobrecarregando a Michelin, que passou a ser praticamente a única fornecedora. A Pirelli voltava à F-1 para fornecer pneus à Toleman, equipe inglesa que começava a competir na categoria.

No auge dos atritos Bernie Ecclestone, presidente da FOCA, estabeleceu um calendário próprio para 81. A Fórmula 1 estava nitidamente dividida e havia a possibilidade da realização de dois campeonatos distintos, um organizado pela FOCA e outro pela FISA. Construtores ligados à FOCA assinaram um acordo garantindo a participação de um número mínimo de 18 carros no Grande Prêmio da África do Sul, marcado para o dia 7 de fevereiro. A jogada de Ecclestone era ousada, mas acabaria dando certo. Jean Marie Ballestre, presidente da FISA, procuraria logo um acordo definitivo.

"Faziam dois meses que eu não guiava um carro de corrida e tinha perdido quatro quilos nas férias. O reencontro com o pessoal da Brabham foi muito especial para mim. Cheguei muito em cima da hora para os treinos e deveria ter chegado uma semana antes pois o fuso horário e a altitude de Kyalami me incomodaram muito. Como se não bastasse isso na noite de quinta para sexta-feira quase não dormi por causa dos mosquitos. Esqueci de botar flit no quarto. Acho que dormi umas três horas. Mesmo assim fiz o melhor tempo nos treinos".

Antes da largada para o GP da África do Sul surgiu uma dúvida: Que tipo de pneu usar? Choveu muito na manhã da corrida e pouco antes da largada parou. O tempo estava fechado, mas por causa da altitude de Kyalami o ar é muito rarefeito e, se a chuva não voltasse, a pista poderia secar rapidamente. "Decidimos largar com pneus de chuva. O problema era que a Brabham não tinha dois carros de ponta como a Williams e a Lotus. Nessas equipes cada carro largou com um tipo de pneu. Reutemann e De Angelis largaram com pneus slick enquanto Jones e Mansell largaram com pneus de chuva". Chapmann e Williams decidiram jogar com 50 por cento de probabilidade. Na corrida Nelson liderou bastante tempo, chegando a livrar uma vantagem de 40 segundos sobre Reutemann, até que a pista secou. Obrigado a parar nos boxes perdeu a liderança para o argentino. Mesmo assim chegou em segundo, à frente de De Angelis.

Em Kyalami correram 19 carros das 11 equipes ligadas à FOCA. A Williams manteve os mesmos pilotos do ano anterior, Alan Jones e Carlos Reutemann. A Brabham também manteve os pilotos Nelson Piquet e Hector Rebaque. Porém, o piloto mexicano não participou da primeira prova do ano por problemas de saúde, sendo substituído por Ricardo Zunino. Elio De Angelis foi promovido a primeiro piloto da Lotus, no lugar de Mario Andretti, e o inglês Nigel Mansell foi contratado pela equipe inglesa. Emerson Fittipaldi dediciu encerrar sua carreira de piloto, se dedicando à direção de sua equipe. Como primeiro piloto da Fittipaldi ficou o finlandês Keke Rosberg, e foi contratado o brasileiro Chico Serra, que estreou muito bem em Kyalami, causando boa impressão. John Watson se manteve fiel à McLaren, enquanto que Alain Prost deixou a equipe, sendo substituído por Andréa De Cesaris. A Arrows manteve Riccardo Patrese, enquanto se desligava da equipe o alemão Jochen Mass, dando lugar a Sigfried Stohr, médico psiquiatra que tinha sido campeão italiano de F-3. Eddie Cheever deixou a Osella e ingressou na Tyrrell, que também alinhou um carro para a sul-africana Desiree Wilson, somente para essa prova. Derek Daly passou a guiar um March — que retornava à F-1 depois de quatro anos de afastamento —, ao lado do chileno Eliseo Salazar. A teimosa Ensign contratou o suíço Marc Surer e a não menos teimosa ATS manteve o holandês Jan Lammers. A Theodore continuava sua aventura na F-l com seu único carro sendo pilotado por Geoff Lees.

Depois de quase seis meses de brigas envolvendo diretamente Jean Marie Ballestre e Bernie Ecclestone os integrantes do circo puderam respirar mais aliviados com a assinatura da "Convenção de Concórdia", acordo firmado entre os dois presidentes de entidades, intermediados por Enzo Ferrari. A briga terminou em confraternização. Ficou acertado que a FOCA não se envolveria com os regulamentos técnicos estabelecidos pela FISA, com validade até 1984. Em contrapartida a FISA não se intrometeria nos assuntos comerciais de Bernie Ecclestone. Finalmente foi elaborado um calendário oficial. E ficou decidido ainda que o GP África do Sul não contaria pontos para o campeonato.

Firmado o acordo, todos os carros foram levados a Long Beach, primeira prova oficial do Campeonato de 1981. As minissaias móveis, equipamento que realmente vinha comprometendo a segurança na F-l, foram proibidas pela FISA. O efeito-solo havia aumentado demais a velocidade dos carros nas curvas, tornando-os mais fáceis de pilotar, mas também muito mais perigosos.

Para Emerson Fittipaldi a simples retirada das minissaias móveis não diminuiria a velocidade dos carros. Para o campeão era preciso eliminar por completo o recurso do efeito-solo. Mario Andretti, que tinha sido campeão em 78 graças ao carro-asa criado por Chapmann, afirmou: “Ainda bem que saiu a proibição. Os carros com minissaias eram fáceis demais de guiar. Agora vamos pilotar de verdade".

Essa medida levou os projetistas a buscar rapidamente uma solução aerodinâmica que reproduzisse o efeito-solo. Uma tarefa difícil. O regulamento estabelecia que nenhuma peça móvel poderia funcionar no movimento do chassi do automóvel. Exigia também uma altura mínima de três polegadas entre o chão e o ponto mais baixo do chassi quando estivesse parado ou ao sair dos boxes. Os projetistas procuravam, na verdade, uma maneira de burlar o regulamento.

Gordon Murray, na tentativa de superar o problema, utilizou uma suspensão equipada com uma mola normal e outra hidráulica. A chamada suspensão hidropneumática. Esse sistema criado por Murray consistia no seguinte: parado ou ao sair dos boxes o carro tinha uma altura normal. Mas na pista, quando o carro atingia a velocidade aproximada de 120 km/h, com o aumento da pressão aerodinâmica, ele abaixava e a abertura das minissaias — elas existiam, mas não eram móveis e, portanto, se enquadravam ao regulamento - em relação ao solo era mínima, vedando 90% do ar que passava por baixo do carro. Houve alguns problemas nos testes iniciais, mas a inovação mostrou que daria certo. A genialidade de Murray e o complemento de dedicação e talento de Piquet desequilibravam a disputa.

O Lotus 88, nova criação de Colin Chapmann, gerou polêmica. O chefe de equipe inglês afirmava que o carro tinha dois chassis. Na verdade o Lotus 88 possuía duas "mantas'' laterais com minissaias acionadas por molas bem macias. Esse conjunto abaixava com o aumento da pressão aerodinâmica. Era um conjunto separado do restante do carro, móvel, e por esse motivo, fora do regulamento. Várias equipes protestaram e o carro só pode participar para posterior vistoria técnica. Também tentaram impugnar o carro da Brabham, mas não ficou configurada a ilegabilidade.

Outro carro que chamou muito a atenção foi a Ferrari equipada com motor turbo, conduzida pelos pilotos Gilles Villeneuve e Didier Pironi, que substituiria a Jody Scheckter.

Entre as equipes que não participaram da corrida de Kyalami a Alfa Romeo manteve Bruno Giacomelli e contratou Mario Andretti. A Osella continuaria sua aventura tendo Beppe Gabbiani e Miguel Angel Guerra na condução de seus carros. A Renault contratou Alain Prost para substituir o acidentado Jabouille, e manteve René Arnoux. A Ligier manteve Jacques Laffite e daria uma nova oportunidade a Jean Pierre Jabouille, que se recuperava do grave acidente que sofrera. A Toleman fazia sua estréia na categoria com os pilotos Brian Henton e Derek Warwick. Das equipes que correram na África do Sul apenas duas mudanças significativas: Patrick Tambay retornou à F-l na condução do único carro da equipe Theodore e a ATS colocou mais um carro na pista, para Slim Borgudd, figura notória por ser baterista do famoso grupo musical ABBA. Como piloto Borgudd se revelaria um excelente músico.

Riccardo Patrese estabeleceu o melhor tempo nos treinos para o Grande Prêmio de Long Beach, Estados Unidos. Um resultado imprevisível. Mas ninguém acreditava que o Arrows suportaria o forte ritmo de corrida que seria obrigado a imprimir para vencer. E não suportou mesmo. Patrese liderou parte da prova e depois quebrou. Com um carro totalmente novo Nelson conseguiu chegar em terceiro, atrás das Williams de Alan Jones e Carlos Reutemann. ''Durante a corrida o carro não estava no melhor de suas condições. Acho até que foi uma corrida monótona. As Williams dominaram e já dava pra notar que seriam adversárias muito difíceis. Meu carro não era páreo para a Williams em Long Beach".

A BMW (Bayrische Motoren Werke) anunciou em Munique, Alemanha, que passaria a fornecer motores turbocomprimidos à equipe Brabham, inicialmente com exclusividade. O motor, de litro e meio, derivado de um modelo de 1961 da BMW, de quatro cilindros em linha e quatro válvulas por cilindro implantados no cabeçote e bielas de titânio, estava sendo submetido a testes e já atingira 560 HP a 9.500 rpm. Sua estréia estava prevista ainda para a temporada de 81. Pela primeira vez em 18 anos — desde que a Porsche encerrou sua curta incursão na categoria — um motor alemão voltaria a ser utilizado na F-1. "Com a equipe Brabham e seu principal piloto, o brasileiro Nelson Piquet, a BMW encontrou um sócio prometedor", disse um porta-voz da empresa alemã.

Nelson estava satisfeito com o resultado da primeira corrida oficial da temporada, mas como para ele "o importante é vencer", como costuma dizer, estava confiante no novo carro e se achava em condições de conseguir uma vitória em Jacarepaguá. Depois de um descanso em Angra dos Reis, passeando pelo mar com sua lancha de marca Magnun — que batizou com o nome "bang-bang" — seguiu para o Rio de Janeiro a fim de iniciar seus treinamentos.

Jacarepaguá era ainda um circuito desconhecido para Nelson e o primeiro contato com a pista foi desanimador. Na quarta-feira, primeiro dia de treino, seu carro estava péssimo e só conseguiu o 20º tempo. Homem de sólidos conhecimentos técnicos, Gordon Murray confiava no talento de Nelson e afirmou no final desse treino: "Já descobri o que estava errado no carro de Piquet. Passaremos o dia de amanhã trabalhando na suspensão e o carro ficará acertado. E garanto que na sexta-feira o Nelson será um dos três mais rápidos. Mas meu objetivo é a pole-position. O carro foi preparado para isso e tenho certeza que o Piquet chegará lá". E aconteceu. Na sexta-feira Nelson fez o segundo melhor tempo, atrás de Reutemann e à frente de Jones. Delineava-se um duelo entre Piquet e os dois pilotos de Frank Williams. E no sábado Murray atingiu seu objetivo: Piquet conquistou a pole-position. Piquet e Murray formaram uma das mais perfeitas duplas piloto-projetista da história da Fórmula 1.

Mas não só de acertos viveu a Brabham naquela época. Uma hora antes do início do Grande Prêmio do Brasil começou a chover. "A chuva não era forte e eu achei que logo pararia. E se a chuva parasse mesmo e estivéssemos usando pneus para pista molhada teríamos um grande problema: com a suspensão hidropneumática o carro ficava baixo demais e não subia imediatamente quando diminuía a velocidade. Eu teria que entrar nos boxes bem devagar, caso contrário pararia com o carro muito baixo e não daria espaço para os macacos. E também estaria fora de regulamento. Argumentei tudo isso com a equipe e opinei — e não decidi, como todo mundo afirmou na época — por correr com pneus slick. Na verdade ninguém estava muito disposto a assumir a responsabilidade. Eu tinha a convicção de que a chuva pararia. E por isso fui para o grid com os pneus slick. Infelizmente a chuva não parou e fiz uma péssima corrida".

Quase todos os carros largaram com pneus de chuva e Nelson "apostou na zebra". Bernie Ecclestone, muito irritado depois da corrida criticou Nelson: "Dei ao Nelson o melhor carro que a Brabham já fez porque queria que ele vencesse no seu país. Mas ele foi um estúpido e jogou fora a maior chance de sua carreira". Os jornalistas que ouviram esta declaração chegaram a pensar que a posição de Nelson na Brabham estava ameaçada. Mas no fundo Ecclestone, com toda a sua astúcia, não queria perder o mais talentoso piloto da F-l. E Nelson nem se preocupou com isso: "Estou pouco ligando se o Bernie achou minha decisão estúpida. É o tal negócio: se acontece algo errado o culpado é o piloto; se o piloto vence aí dizem que foi o perfeito desempenho do carro".

Outro fato acontecido na corrida de Jacarepaguá ganhou destaque nas páginas dos jornais do dia seguinte: Carlos Reutemann venceu a prova desobedecendo ordens de Frank Williams. O chefe de equipe inglês tinha preferência por Alan Jones, que já tinha vencido em Long Beach, prova em que Reutemann chegou em segundo. A equipe sinalizou para que o argentino cedesse a liderança ao australiano. Reutemann não obedeceu e venceu a corrida, com Jones chegando em segundo. Apesar da dobradinha o clima na equipe Williams era de mal-estar depois da corrida. Profundamente irritado Jones desceu do carro e disse aos jornalistas: "Agora sei bem que espécie de pessoa é o Carlos Reutemann. A tática de equipe será bem diferente daqui pra frente".

Reutemann alegou não ter visto a placa que indicava a preferência da equipe: Jones em primeiro, Reutemann em segundo. "Comentaram que o Alan se irritou e por isso ele não foi ao pódio. Tudo o que sei é que, ao descer do carro, o Alan me deu a mão e se foi. Os motivos que o levaram a não subir no pódio eu desconheço''. A partir de Jacarepaguá, Jones e Reutemann cortaram relações definitivamente. A equipe Williams enfrentaria problemas internos com seus dois pilotos o ano inteiro. Frank Williams sobre isso disse: "Os dois pilotos podem ter suas desavenças desde que não afetem a atuação da equipe. Eles dirigem para mim e não para eles mesmos".

Muitas críticas foram feitas a Nelson por causa da escolha dos pneus. E para piorar outras equipes questionavam o enquadramento de seu carro ao regulamento. Escolha de pneus à parte, o piloto ficou satisfeito com o carro: "A máquina correspondeu inteiramente à expectativa. Se dependesse dela teria lutado por uma boa posição". Quanto à ilegalidade ou não do Brabham Jean Marie Ballestre declarou: "O novo regulamento não proíbe a aplicação do sistema que a Brabham utiliza e não contraria as normas em vigor. Inclusive já está sendo copiado por outras equipes". Mas a polêmica sobre a ilegalidade do Brabham se arrastaria por mais algum tempo.

Nos treinos para o Grande Prêmio da Argentina a briga Jones x Reutemann era o assunto mais comentado pela imprensa e torcida argentina. Todos os argentinos esperavam por uma vitória de Reutemann, que dividia a liderança do campeonato com Jones. Os melhores tempos de Prost e Arnoux, ambos com Renault, também mereceram comentários. Nelson, quinto colocado no treino de quinta-feira, ocupava uma posição secundária nas atenções. "Não tenho nada a provar, mas garanto que sinto uma necessidade especial de ganhar essa corrida. Meu carro está bem, está tão equilibrado quanto estava no Rio de Janeiro".

Depois de ter estabelecido a pole-position Nelson venceu o Grande Prêmio da Argentina. "Foi a corrida mais mole que ganhei na minha vida. Fui apenas superado pelo Jones na largada, passei por ele na reta e daí em diante só me preocupei em levar o carro até o fim. Só fiquei preocupado, e até chateado, porque quando faltavam cinco voltas para o fim da corrida os argentinos jogaram uma laranja que quase acertou meu carro. Eles estavam frustrados porque eu ia ganhar do Reutemann. O mais legal foi na noite depois da corrida. Tivemos uma festa de confraternização numa churrascaria e o meu irmão Geraldo estava junto. A festa terminou numa grande guerra de pão. O dono da churrascaria cobrou mais caro mas nem liguei porque não fui em quem pagou a conta. Quando saímos a polícia estava à nossa espera. Algumas explicações e tudo terminou bem". Reutemann chegou em segundo na Argentina e Prost em terceiro.

Bastou uma vitória, que muitos chamaram de "reabilitação", para que todos voltassem a falar no título de Nelson. Ele mesmo não queria fazer previsões: "As pessoas se empolgam demais. No ano passado a Renault ganhou as duas primeiras corridas e todo mundo falava que o título já era dela. Aí as coisas mudaram na Europa. A F-l é cheia de pequenos detalhes técnicos que se alteram com facilidade".

Em abril de 81 Nelson mudou-se para Monte Cario, em Mônaco, passando a ser vizinho dos pilotos Alan Jones e Jody Scheckter, do tenista Bjorn Borg e do esquiador Ingemar Stenmark. Ele não se mudou para Monte Cario apenas em busca de sol e clima mais ameno, mas, principalmente, para fugir do rigoroso imposto de renda inglês.

Ímola era um autódromo muito conhecido de Nelson. Tinha vencido a corrida no ano anterior. Villeneuve causou surpresa ao conquistar a pole-position, seguido por Reutemann, Arnoux, Prost, Piquet, Pironi, Watson, Jones, Patrese e Laffite, completando os 10 primeiros. Antes da largada uma garoa fina caiu sobre o autódromo e Nelson ganhou um presente dos mecânicos da Brabham: uma casinha de madeira parecida com um cuco. Apontando-se uma flecha para o sol saía da porta da casinha um pneu slick e apontando-se para a nuvem aparecia um pneu de chuva. Nelson olhou para o céu e não teve dúvidas: apontou a flecha para a nuvem, vendo sair um pneu de chuva. E ganhou a corrida de forma sensacional, sem erros, partindo de trás, superando os adversários com calma até conquistar a liderança. Patrese foi o segundo e Reutemann o terceiro.

Depois de dois meses de muito trabalho e muita polêmica — devido aos protestos de várias equipes quanto ao novo sistema de suspensão da Brabham — Nelson partiu para Zolder confiante, com seu carro equipado com a suspensão hidropneumática totalmente aprovada pela FISA.

Os treinos na Bélgica foram bons para o piloto brasileiro, mas a corrida foi péssima. ''Nunca tive muita sorte em Zolder. Na sexta-feira houve um acidente quando o Reutemann atropelou um mecânico, que acabou morrendo. Depois, para complicar, na largada, o Stohr bateu na traseira do Patrese e 'espremeu' outro mecânico entre os dois carros. Eu estava bem na corrida, em segundo, quando o Jones se aproximou e bateu em mim numa das curvas, me jogando nas telas. O Jones é uma besta e estava desesperado porque o Carlos andava na frente dele. Nunca foi um piloto excepcional e foi campeão porque teve a sorte de pegar um carro bem acertado e um bom desenhista. Disse ao Jones que o jogaria para fora da pista na primeira oportunidade que tivesse''. Nelson ficou bastante irritado com o australiano. Reutemann venceu uma corrida que não pode comemorar - Laffite foi o segundo e Mansell o terceiro.

Pela primeira vez um piloto brasileiro tinha grandes possibilidades de vencer o Grande Prêmio de Mônaco, a mais tradicional corrida da Fórmula 1. Nelson conquistou a pole-position, à frente de Villeneuve, Mansell, Reutemann, Patrese, De Angelis e Jones. Mas o resultado voltou a ser ruim para Nelson. Ele liderava a prova com relativa vantagem sobre Jones e Villeneuve quando tentou ultrapassar Tambay num ponto difícil e bateu no guard-rail. Perdeu a corrida e a vice-liderança para Jones no campeonato, que foi o segundo colocado na prova. Villeneuve venceu dando show e Laffite foi o terceiro.

Na Espanha também não marcou pontos, depois de largar em nono lugar. Para seu azar Reutemann chegou em quarto mas, para amenizar, Jones não marcou pontos. E Villeneuve conquistou sua segunda vitória com a Ferrari turbo. Laffite e Watson, ambos voltando a disputar os primeiros lugares chegaram a seguir. “O carro estava muito difícil de guiar. Desequilibrava demais nas freadas, o que me obrigou a redobrar a atenção. Fiz o que pude para me manter na prova, até que sai da pista e fui parar nas telas de proteção".

Com três acidentes em três corridas consecutivas a imprensa falava no "insucesso" de Nelson questionando uma possível ''depressão psicológica". "Essa não! Jamais dois ou três resultados negativos vão me abalar assim. Continuo o mesmo. Vou muito bem, obrigado. Absolutamente nada de anormal se passa comigo".

Antes do GP da França a Goodyear decidiu voltar a fornecer pneus para a F-l, atendendo aos apelos de algumas equipes. A Michelin, por sua vez, decidiu fornecer pneus apenas para as equipes com as quais mantinha contrato: Ferrari, Renault, Ligier e Alfa Romeo. Estava de volta a guerra dos pneus.

Com um carro construído em fibra de carbono a McLaren com John Watson virou um segundo e meio mais rápido que o segundo carro com motor Cosworth no treino de sexta-feira, em Dijon. Nelson só conseguiu o 11º tempo. O irlandês perdeu a pole no sábado para Arnoux, ficando em segundo e Nelson fez o quarto tempo, atrás de Prost.

“Acho que dei uma das melhores largadas da minha vida em Dijon. Liderei a corrida até a 58ª volta, quando a prova foi interrompida por causa da chuva. Aconteceria uma nova largada. Enquanto esperava nos boxes o fim da chuva vi uma grande movimentação nos boxes da Renault. Senti um frio na espinha quando vi os pneus de Prost. Entendi que eles voltariam com pneus de classificação para as 22 voltas restantes da prova, consertariam a caixa de câmbio do Prost e dariam mais pressão no turbo. Me senti derrotado. Eu não tive pneus de classificação nem nos treinos. Não gostei do que a organização da prova fez. Mais duas voltas e poderiam terminar a corrida normalmente. Mas resolveram interromper a prova para colocar o carro do Prost em condições de vencer. Além disso o Pironi me segurou durante muito tempo. Os franceses fizeram tudo para quem um francês vencesse. E conseguiram", desabafou Nelson. Ele ficou em terceiro na prova e subiu ao pódio revoltado com tudo que lhe fizeram.

A única vantagem que levou no GP da França foi a de ter passado à frente de Jones no campeonato. Mas isso não deve nem ter passado pela sua cabeça naquele momento.

No final do último treino oficial para o GP da Inglaterra Nelson Piquet era outra pessoa. Brincando com todo mundo, dando autógrafos, falando muito. Estava muito confiante. Tinha acabado de marcar o terceiro melhor tempo, atrás das Renaults de Arnoux e Prost. "Tudo foi ótimo. O carro está perfeito. Correr em Silverstone é como correr em casa, pois é nesta pista que faço a maioria dos testes. Acho que está na hora da sorte sorrir para mim, não acha? Tudo está pronto para eu fazer uma grande corrida. E não tenho a menor dúvida que farei".

Mas a sorte parecia ter mesmo abandonado Nelson. "Eu me aproximava da curva Becketts quando o pneu dianteiro esquerdo estourou, o carro balançou violentamente e bati forte no guard-rail. Sai do carro ajudado por um fiscal, com o joelho esquerdo ferido''. Nesse momento Nelson corria em terceiro, atrás das Renaults — que depois quebrariam — e tinha tudo para vencer. A vitória acabou ficando com John Watson, com McLaren. Reutemann chegou em segundo e a situação de Nelson no campeonato ficou muito difícil. Reutemann subiu para 43 pontos enquanto Nelson permaneceu com 26. Com uma diferença de 17 pontos. Faltando 6 provas para o final do campeonato, a conquista do título parecia impossível.

Os azares de Brasil, Mônaco, França e Inglaterra foram compensados na Alemanha, em Hockenheim. “Tudo correu bem nos treinos e fiz o sexto melhor tempo. No warm up a temperatura dos pneus chegou a 240 graus. O dia estava quente e se a temperatura ambiente continuasse alta teria que fazer uma troca de pneus. Na corrida larguei mal. Primeiro superei Laffite e depois Reutemann; algumas voltas mais tarde, ultrapassei Prost e, graças a dois abandonos, fiquei em segundo. Uma garoa caiu sobre a pista e foi muito bom porque evitou uma troca de pneus. O boxe me avisou que Jones, o líder, estava com problemas. Forcei o ritmo e passei por ele na 40ª volta. Daí para a frente me preocupei apenas em chegar". A situação ficou um pouco melhor no campeonato porque Reutemann não marcou pontos, permanecendo nos 43, enquanto Nelson subiu para 35.

Carlos Reutemann não escondia seu descontentamento pela preferência de Frank Williams por Alan Jones. Depois de Hockenheim ele afirmou que o motor de seu carro tinha 5 HP a menos que o do australiano. "Não compreendo esta atitude de Frank. Simplesmente não sei o que pensar. Esse procedimento é totalmente inexplicável. Piquet está muito perto agora, e a única coisa que poderia acordar a Williams é a possibilidade de perder o mundial. Se o Frank não reagir esta semana, perderemos. Não posso fazer mais nada do que estou fazendo. Estou demasiadamente só", desabafou o argentino.

Na Áustria, Jacques Laffite venceu, René Arnoux chegou em segundo e Nelson Piquet em terceiro. A situação do campeonato poderia ter ficado melhor se Reutemann não tivesse chegado em quinto. Nelson poderia até ter vencido, não fosse a quebra de um pedaço de uma das minissaias do Brabham. Reutemann com 45, Piquet com 39 e Laffite com 34 poderiam ainda conquistar o título. Matematicamente, Jones (27), Villeneuve (21), Watson (21) e Prost (19) ainda tinham chances de se tornarem campeões.

"Não pretendo ajudar o Reutemann enquanto tiver possibilidade a meu favor, pois ele nunca me ajudou. Disputarei minha posição com ele até acabarem minhas esperanças na conquista do título. Em Zandvoort haverá uma definição clara dos reais candidatos ao título". Alan Jones mostrou claramente como se sentia em relação ao seu companheiro de equipe e estava certo quanto à sua definição dos candidatos ao título.

Os Renaults registraram os dois melhores tempos nos treinos de Zandvoort, com Prost e Arnoux, seguidos por Piquet, Jones, Reutemann e Laffite. Para Nelson melhor resultado só mesmo a vitória. Ele chegou em segundo lugar, sem a menor chance de disputar a liderança com Alain Prost, que venceu de ponta a ponta. O que melhor aconteceu para o brasileiro foi a batida envolvendo Carlos Reutemann e Jacques Laffite. Os dois bateram ao disputar uma freada e abandonaram. Nelson passou para 45 pontos, empatando na liderança com Reutemann, ficando Laffite em terceiro com os mesmo 34 pontos e Alan Jones em quarto com 31, após ter chegado em terceiro.

Desde os tempos de Jack Brabham a equipe Brabham não ganhava um título mundial. Apesar de ter contratado bons pilotos Bernie Ecclestone não conseguira ainda ganhar um campeonato até 1981, quase 10 anos depois de ter comprado a equipe. Mas com Nelson Piquet sentia que estava chegando o momento: "Quando contratei José Carlos Pace tinha a certeza de que o título viria através dele, um excelente piloto e uma das melhores pessoas que conheci. Infelizmente ele morreu "naquele acidente. Mas está acontecendo com outro brasileiro. O Piquet está correndo como um campeão. Está fazendo tudo certo. Este campeonato tem que ser dele".

A crise interna da equipe Williams se agravou depois da corrida da Holanda, quando Reutemann fez críticas ao carro que pilotava, o que acabou gerando reclamações de alguns mecânicos, enquanto outros membros da equipe faziam sérias restrições à atuação de Reutemann em Zandvoort, afirmando que ele realmente forçou uma passagem perigosa sobre Laffite e acabou também sendo prejudicado. Ao mesmo tempo em que criticava sua equipe o argentino dizia que "nem tudo está perdido na luta pelo título".

O Grande Prêmio da Itália marcava o início da decisão do título de 1981. Arnoux fez o melhor tempo, seguido por Reutemann, Prost, Laffite, Jones e Piquet. "A corrida da Holanda foi um sonho, mas a da Itália um pesadelo. Estava em terceiro, à frente do Reutemann, o que era que me interessava muito, pois assumiria a liderança do campeonato. Passei em frente aos boxes tranqüilo e iniciei a última volta. Mas depois da primeira gincana vi a luz do óleo acender e ouvi o barulho: brruumm. O motor tinha explodido. Era o fim. Tive vontade de chorar". Alain Prost venceu a prova, com Alan Jones em segundo e Carlos Reutemann em terceiro.

"O Jones deveria ter cedido o segundo lugar", reclamou o argentino. Nelson, mesmo tendo parado, ainda ficou com o sexto lugar. Reutemann passou a somar 49 pontos, contra 46 de Nelson, 37 de Jones e Prost empatados e 34 de Laffite.

Frank Williams declarou, contrariando Reutemann, que sua escuderia continuaria dando todo o apoio a ele, mas que não podia esquecer de Jones pois, matematicamente, também podia ser campeão. "Isso é uma loucura. O apoio tem que ser todo meu e o Jones terá que me ajudar. Tenho mais possibilidades de ganhar o título do que ele", disse Reutemann. Enquanto isso, Jones anunciava que abandonaria o automobilismo no final do ano.

Todas as atenções estavam voltadas para o duelo entre Piquet e Reutemann pelo título mundial. E a expectativa aumentou nos treinos para o GP do Canadá, em Montreal: Nelson fez o melhor tempo e Reutemann o segundo. Os dois principais candidatos ao título largando na primeira fila. Nelson afirmava ser paciente quanto à conquista do título: “Se não vencer este ano, paciência, o campeonato será meu em 82. Mas se caso eu for campeão vou fugir da badalação. Tenho horror a essas coisas. Se me obrigarem a isso, me esconderei no mato". Já Reutemann parecia obcecado: "Ou ganho este ou nunca mais ganharei".

A vitória no confuso GP do Canadá foi conquistada por Jacques Laffite, com coragem e técnica. Choveu durante a corrida e os pneus que Nelson usava eram inferiores aos Michelin e acabou em quinto lugar. Watson foi o segundo e Villeneuve o terceiro. Com mais dois pontos Nelson ficou com 48, um a menos que Reutemann, enquanto Laffite ficou com 43. Estes eram os únicos pilotos que partiriam para a última prova da temporada em condições de conquistar o título. "O resultado foi bom. Praticamente eliminamos a diferença em relação à Reutemann e agora só precisamos chegar na frente dele em Las Vegas. E o título será nosso", afirmou o confiante Gordon Murray.

A temporada de 81 vinha sendo dramática para Nelson. Primeiro foi o problema da escolha dos pneus no Brasil e as conseqüentes críticas da imprensa e de Bernie Ecclestone. O desenvolvimento da suspensão hidropneumática e do motor turbo vinha exigindo exaustivos testes. Os protestos das demais equipes contra seu carro também o deixaram muito aborrecido. Veio a batida em Mônaco, um desentendimento com Tambay, foi jogado fora da pista por Jones em Zolder, a injustiça na França e a derrota numa corrida praticamente ganha. Teve ainda o pneu estourado e a batida na Inglaterra. Foi um campeonato difícil, que chegou à última prova indefinido.

Como se não bastasse toda essa tensão, por causa do mal sucedido tratamento de um torcicolo, sofreu muito nos treinos para o Grande Prêmio de Las Vegas, justamente a prova decisiva do campeonato. As terríveis dores no pescoço começaram no treino de quarta-feira. "Comecei a receber massagens e acupuntura na região afetada e melhorou um pouco. Apesar de ter sido muito bom, relaxante, nos treinos as dores voltavam. Consegui o quarto melhor tempo, atrás de Reutemann, Jones e Villeneuve. A situação não era boa e as dores no pescoço eram fortes demais".

A corrida seria também dramática para Nelson, como tinham sido todas as conquistas de sua carreira, sempre às custas de muito sacrifício. As dores continuavam fortes e, antes do warm up, recebeu nova massagem e uma boa camada de pomada analgésica no pescoço. O circuito improvisado no estacionamento de um hotel era extremamente desgastante. Reutemann largaria à sua frente e isso era preocupante. Laffite, em 12º, estava numa posição muito difícil.

Logo após a largada Jones disparou na frente. Reutemann, nas voltas iniciais, caiu para sétimo e Nelson também perdeu algumas posições. Paciente, o brasileiro fez uma corrida inteligente, ganhando posições calmamente. A ultrapassagem decisiva de Nelson aconteceu na 17ª volta quando superou definitivamente Carlos Reutemann, que não fazia boa corrida, com problemas no câmbio. Mas a ultrapassagem não foi tão simples assim. "O Carlos freou tentando provocar uma batida minha. Só que freou demais, o suficiente para que eu passasse". Nelson continuou sua corrida enfrentando as dores e o problema de estabilidade do carro, e não se incomodou em perder posições para Mansell e Giacomelli. Estava pensando no campeonato. E conquistou-o com garra e inteligência. Chegou em quinto lugar, conquistando dois pontos e superando Reutemann por um ponto.

Alan Jones venceu a corrida, à frente de Prost, e comentou: “Foi maravilhoso dar uma volta sobre o Reutemann e vê-lo perder o título".

O argentino Carlos Reutemann era um homem profundamente amargurado. “Foi o dia mais triste da minha vida. Nunca me preparei tanto para um campeonato. Liderei desde a segunda prova, mas tive problemas com a minha equipe. Agora tudo passou. Acabei de perder o campeonato para o garoto que um dia limpou as rodas do meu carro".

Nelson Piquet escreveu para a revista brasileira "Quatro Rodas": "Não foi fácil, e as últimas voltas foram minutos terríveis. Com a tensão, mais a dor física e aquela confusão do final acabei desmaiando na garagem. Depois de me recuperar, procurei atender todos os jornalistas. Cada um chegava e dava um tapa no ombro — 'parabéns, Piquet' —, e a cada tapinha eu fechava os olhos... Fiquei muito emocionado quando o Emerson veio me abraçar. Agora está tudo terminado. Estou feliz por todos aqueles que acreditaram e investiram em mim, estou feliz por ser o segundo brasileiro a conquistar o título. A única coisa que eu peço é que não esperem que eu me comporte como campeão mundial: na verdade, tudo permanece igual, e o trabalho continua".

Caminhando para o pódio, cercado por muitos jornalistas, Nelson chorou por alguns instantes. Mas a emotividade foi logo recolhida. Mais tarde foi comemorar com seus parceiros prediletos, os rapazes da Brabham.

O Nelson Piquet campeão do mundo permanecia o mesmo. Continuava brincando com os mecânicos da mesma maneira que fazia nos tempos de Fórmula 3. Depois diria: "Meu desejo era, naquele momento após a vitória, pegar um avião e descer em Brasília. E dividir aquela conquista com os amigos dos primeiros momentos incertos, indefinidos, inseguros".

Para o jornalista Álvaro Teixeira, em entrevista publicada pela revista brasileira "Veja", Nelson respondeu a uma pergunta que sintetiza o amor que sente pelos carros de corrida: "Sinto um prazer muito grande vendo o carro completamente desmontado. Gosto de olhar para ele e descobrir o que tem de ser feito para correr um décimo de segundo mais rápido na próxima competição. Gosto de discutir com os técnicos, dar minha opinião. A alegria começa com a certeza de que o carro está bem acertado, está melhor que os outros. O resto — vitórias, campeonatos —, é apenas uma conseqüência, um complemento disso tudo".

por Luiz Carlos Lima

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