quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Temporada de Fórmula 1 de 1980

A Fórmula 1 do início da década de 80 se caracterizou, principalmente, pela revelação de excelentes pilotos e pela firmação de outros valores excepcionais que participaram das últimas temporadas da década de 70. Nunca na Fórmula 1 surgiram tantos pilotos talentosos numa mesma época. Poucos veteranos teriam chances de permanecer brigando no bloco da frente. Uma nova geração a partir daí dominaria as pistas, valorizando o automobilismo mundial e proporcionando inesquecíveis espetáculos para o público amante das corridas.

Campeã no ano anterior, a Ferrari não trocou nenhum piloto para 1980. Não havia porque trocar. A escuderia italiana tinha o campeão mundial, o sul-africano Jody Scheckter, 31 anos de idade e 7 anos de F-1 e o vice-campeão mundial, o canadense Gilles Villeneuve, 28 anos e 2 de F-1. A Ferrari lançaria um novo carro, o modelo T-5, e já anunciava o desenvolvimento de um motor turbocomprimido.

A Brabham trocou os problemáticos motores Alfa Romeo pelos tradicionais Ford Cosworth. O BT-49 mostrou-se bem mais eficiente que seu antecessor. Promovido a primeiro piloto, Nelson Piquet, 27 anos, a grande revelação de 79, encontrava liberdade para trabalhar, mostrar seu talento e desenvolver sua técnica. Assumiu o segundo posto de piloto da equipe inglesa o argentino Ricardo Zunino, 30 anos, novato na F-1, em troca de uma expressiva quantia de dólares oriundos, segundo algumas publicações da época, da empresa argentina Yacimientos Petrolíferos Fiscales. Zunino dispunha de muito dinheiro e pouco talento.

Frank Williams vivia seus melhores dias. Sua equipe era a favorita ao título mundial, graças a excelente campanha que fez a partir da segunda metade da temporada de 79, na qual conquistou 5 vitórias, sendo 4 através de Jones e uma através de Regazzoni. 34 anos, 5 de F-1, Alan Jones despontava como provável campeão mundial. O outro piloto da Williams, Carlos Reutemann, 41 anos, 8 de F-1, tinha saído da Lotus - onde criou muitos problemas, assim como já criara na Brabham e na Ferrari. Apesar de bom piloto não era fácil agüentar o temperamental argentino.

A patriótica Ligier continuaria mantendo em seu quadro de pilotos dois franceses. Jacques Laffite, 36 anos, 6 de F-l, ex-mecânico de Jabouille na F-3, mantinha-se como primeiro piloto da escuderia enquanto que Depailler era substituído pelo competente Didier Pironi, 28 anos, um de F-l, que brilhara no ano anterior ao volante de um limitado Tyrrell.

Nada de novo na Renault para o campeonato de 80. No que se referia a pilotos, evidentemente. Permaneceriam Jean Pierre Jabouille, 37 anos, 2 de F-1, vencedor de um GP em 79, e René Arnoux, 31 anos, um de F-1, pelo bom desempenho que vinha mostrando. Assim como a Ligier, uma equipe toda francesa. E a Renault estrearia o seu novo modelo, o RE-20, que prometia surpreender.

Na McLaren saiu um francês e entrou outro. Alain Prost, 25 anos, talentoso e promissor piloto, substituiria a Patrick Tambay, que deixou a equipe desacreditado. O irlandês John Watson, 33 anos, 6 de F-l, continuaria como primeiro piloto, sempre fiel à equipe inglesa.

Ao contrário do que ocorreu no inicio de 79 a Lotus não assustava mais ninguém mesmo com o lançamento do modelo 81, que Chapmann afirmava ser imbatível. O veterano Mario Andretti, 40 anos, campeão mundial de 78, continuaria na equipe. O segundo piloto, substituindo Carlos Reutemann, seria Elio de Angelis, um jovem de 21 anos, integrante de uma abastada família italiana. Só que além de muito dinheiro, Elio também tinha talento. O que é pouco comum. Sua principal característica, notada já desde seu início de carreira na F-l, era a regularidade.

Retornando ao circo, depois de 28 anos de afastamento, a Alfa Romeo causava muita curiosidade. Patrick Depailler, 35 anos, 6 de F-l, ex-Tyrrell e ex-Ligier, partia para uma nova tentativa de acerto com um novo carro. O outro piloto da equipe seria o italiano Bruno Giacomelli, 27 anos, novato em F-1, campeão europeu de Fórmula 2 em 1978 e uma das grandes promessas da Itália. E o fato de correr com um carro italiano aumentava a motivação dos fanáticos torcedores italianos.

A equipe Fittipaldi trocou de patrocinador e apresentava um novo carro, o F-7, modelo de concepções convencionais, mas que prometia ser eficiente. A equipe brasileira tinha adquirido o equipamento e o know how da Wolf e com ela acabou contratando o finlandês Keke Rosberg, 31 anos, 2 de F-l, piloto de reconhecida habilidade, que substituira à altura o ex-campeão James Hunt. O principal piloto da equipe continuaria sendo o bi-campeão mundial Emerson Fittipaldi, 34 anos, a caminho de seu décimo ano na F-l.

Ken Tyrrell prosseguia em sua lenta decadência. Perdeu para a Ligier o piloto Didier Pironi enquanto mantinha Jean Pierre Jarier, 34 anos, 7 de F-l, que já podia ser considerado um veterano. Para o lugar de Pironi, o velho Ken contratou o irlandês Derek Daly, 26 anos, novato em F-1, piloto que causara boa impressão no ano anterior, apesar da fragilidade do Ensign que guiou.

Riccardo Patrese e Jochen Mass permaneceriam na Arrows, equipe que passava por uma sensível ascensão técnica. Patrese, 25 anos, 2 de F-l, vinha mudando seu estilo e com ele ía desaparecendo a imagem inicial de "causador de acidentes". Mass, 33 anos, 6 de F-l, já era um veterano. E sua experiência vinha sendo útil para o desenvolvimento da Arrows.

Se a AS já não ia bem cuidando de apenas um carro como seria preparando dois? A fábrica alemã estava mesmo disposta a investir e apresentava seu novo carro, o D-4, desenhado por Nigel Straud. Um de seus pilotos seria o novato Marc Surer, suíço, 28 anos, que brilhara na Fórmula 2 com um March BMW. O outro seria o holandês Jan Lammers, 23 anos, que no ano anterior correra pela Shadow, com pouco destaque.

A deficitária Shadow continuaria tentando competir com dois carros, conduzidos por dois pilotos novatos: David Kennedy, 26 anos, irlandês; e Stephan Johansson, sueco, 23 anos, vindo da Fórmula 3, categoria na qual manteve grandes duelos com Chico Serra e Andréa De Cesaris.

Rejeitado na Williams, Clay Regazzoni, 40 anos, o mais velho piloto em atividade na F-1 no início de 80, foi contratado pela medíocre Ensign. Mesmo com um carro limitado ninguém duvidava que Clay poderia fazer boas exibições.

Finalmente, a Osella, uma escuderia que decidiu se aventurar na F-l. O carro era totalmente novo e o piloto idem. Com apenas 22 anos de idade, o norte-americano naturalizado italiano Eddie Cheever faria sua incursão na principal categoria do automobilismo mundial.

As principais equipes da Fórmula 1 tinham tudo pronto para disputar a temporada de 80, considerada até então a mais cara de todos os tempos. Em 79, dos 375 pontos que estiveram em disputa, 342 foram conquistados por seis equipes: Ferrari (113), Williams (75), Ligier (61), Lotus (39), Tyrrell (28) e Renault (26). Acrescentando-se a Brabham, os especialistas estavam convictos de que o campeão mundial sairia de uma dessas equipes. Pouco se falava em favoritismo para as equipes McLaren e Fittipaldi. Mas ninguém acreditava nas pequenas (ATS, Ensign, Shadow e Arrows).

O assunto que os chefes de equipes mais discutiam no início do ano era a escalada dos custos, que fatalmente afastaria as equipes pequenas, impossibilitadas de fazerem os investimentos que a evolução técnica da F-l exigia. Esse assunto estava ligado à clara evolução da Renault e seus motores turbo comprimidos. Uma nova era se iniciava e ninguém mais duvidava que os carros da equipe francesa dominariam a F-1 assim que fossem resolvidos os problemas que vinham enfrentando. A grande questão era que o desenvolvimento dos motores turbo exigiriam investimentos insuportáveis para a maioria das equipes. A Ferrari e a Alfa Romeo anunciavam a construção de motores desse tipo para equiparem seus carros. A partir dai a escalada dos motores turbo foi irreversível.

Na primeira corrida do Mundial de 1980, o Grande Prêmio da Argentina, o australiano Alan Jones venceu. A prova foi marcada por muitas quebras devido ao péssimo estado da pista. Nelson Piquet chegou em segundo lugar, comprovando que dispunha de um bom equipamento, complemento indispensável para um piloto de talento brilhar. Keke Rosberg foi o terceiro, com o Fittipaldi, surpreendendo a todos, seguido por Daly (Tyrrell), Giacomelli (Alfa) e Prost (McLaren), este último com atuação muito elogiada na sua estréia na F-l.

Entusiasmado com o bom resultado, ainda no pódio, Nelson disse: "O BT-49 é tão competitivo quanto o Williams, principalmente nas retas. Meu problema está na suspensão, que é muito macia, e abaixa em demasia a frente do carro nas curvas. Trocaremos as molas macias por outras mais duras. E aí tenho certeza que vou disputar a pole-position".

Didier Pironi dominou totalmente o treino extra-oficial do GP do Brasil com um desempenho excepcional. Laffite, De Angelis, Reutemann, Jones e Andretti completaram os melhores tempos. No primeiro treino oficial o domínio foi da Renault, com Jabouille e Arnoux. O grid só foi definido mesmo no sábado. Jabouille ficou na frente, seguido de Pironi, Villeneuve, Reutemann e Laffite. Nelson ficou em nono. Todos os pilotos que alinharam viraram tempos abaixo do recorde de Interlagos, que pertencia a Jacques Laffite, com 2'28"76. Jabouille, o pole-position, virou em 2'21"40 e Daly, o último do grid, em 2'28"21. O resultado final da última prova de Fórmula 1 disputada em Interlagos foi uma surpresa para todos: René Arnoux venceu com o Renault RE-20, seguido de De Angelis, Jones, Pironi, Prost e Patrese, completando os seis primeiros. Nelson chegou a andar em quinto lugar, depois de ter largado mal, mas foi obrigado a parar nos boxes para trocar um pneu furado. Quando voltava à pista a suspensão quebrou, tirando qualquer chance de recuperação do brasileiro.

A Renault voltou a dominar no treino oficial para o Grande Prêmio da África do Sul. Jabouille e Arnoux foram melhores que Piquet, Laffite, Pironi e Reutemann. Uma performance impressionante dos F-l: 22 carros dentro de 2 segundos. Em Kyalami René Arnoux venceu sua segunda corrida consecutiva. Foi uma festa francesa: Laffite foi o segundo e Pironi o terceiro. Nelson foi o quarto, seguido de Reutemann e Mass. Estaria começando a era da Renault? Nelson estava satisfeito com o quarto lugar e sentia que o carro evoluía muito bem. Não faltava dedicação de sua parte, como sempre.

Long Beach, 30 de março de 1980. A primeira vitória de Nelson Piquet na Fórmula 1 veio muito antes que se esperava. Desde os treinos no circuito improvisado nas ruas de Long Beach o brasileiro dominou. Registrou o melhor tempo, à frente de Arnoux, Depailler, Lammers, Jones e Giacomelli. Na 10ª volta da corrida Nelson já tinha 15 segundos de vantagem sobre o segundo colocado e se preocupou em manter um ritmo seguro. Com a vitória passou a liderar o campeonato, com 18 pontos, empatado com René Arnoux. Se na África a festa tinha sido francesa, em Long Beach a festa foi brasileira. Emerson Fittipaldi ficou em terceiro, atrás de Patrese. Completaram os seis primeiros: Watson, Scheckter e Mass. O acontecimento triste da corrida foi o acidente sofrido pelo veterano Clay Regazzoni, que bateu violentamente com seu Ensign, sofrendo fratura composta da perna direita e lesão na coluna vertebral. Apesar de todos os esforços dos médicos, Clay foi obrigado a abandonar as corridas, impossibilitado de voltar a andar.

Pouco depois de sua primeira vitória na F-l, Nelson fez esta declaração à revista brasileira "Auto Motor": "Não é fácil descrever o que senti. Desde as últimas voltas da corrida, quando parecia estar com a vitória garantida, mas poderia, a qualquer momento, acontecer alguma coisa com o carro, até quando subi no pódio para receber o prêmio e o Emerson me abraçou. Senti vontade de chorar, é claro, mas há um pensamento mais forte do que tudo isso: o de que estamos lá para passar por esses momentos, estamos trabalhando para chegar a isso, e temos que acreditar que virão muitas outras vitórias. Eu não sou nada frio, sinto plenamente todas as emoções de uma vitória como essa, mas tenho que ver a coisa como parte de um todo. Daqui a pouco, estarei com duas, três ou mais vitórias, e vai haver coisa mais importante a ser conseguida".

Nelson desembarcou em Congonhas na quarta-feira seguinte à corrida de Long Beach e logo foi cercado por inúmeros repórteres. Introvertido e avesso a entrevistas, Nelson nunca teve nada do que se requer de um ídolo. E continua agindo dessa forma: "Quando me perguntam sobre automobilismo eu gosto de responder. Mas quando me fazem uma pergunta imbecil não sei o que dizer".

Em Zolder, na Bélgica, aconteceu a quarta prova do mundial de 80. Williams, Ligier e Renault dominaram os treinos. Jones registrou a pole-position, com Pironi, Laffite, Reutemann, Jabouille e Arnoux vindo a seguir. Piquet, De Angelis, Jarier e Depailler completaram os 10 primeiros. Didier Pironi também venceu seu primeiro Grande Prêmio, seguido pelas Williams de Jones e Reutemann. Nelson saiu da pista e bateu quando o freio de seu carro travou, não conseguindo fazer a curva. Com esse resultado Arnoux, que chegou em quarto, assumiu a liderança isolada do campeonato, com 21 pontos, seguido por Jones com 19, Piquet com 18 e Pironi com 17.

No Grande Prêmio de Mônaco três segundos separavam o pole-position do último colocado do grid. Os 10 melhores foram: Pironi, Reutemann, Jones, Piquet, Laffite, Villeneuve, Depailler, Giacomelli, Jarier e Prost. Nelson sabia que dificilmente venceria a corrida: “Em Monte Carlo é quase impossível ultrapassar. O mais importante será chegar entre os seis primeiros". E conseguiu o que pretendia: ficou em terceiro, atrás de Reutemann e Laffite e à frente de Mass, Villeneuve e Fittipaldi. Com os quatro pontos Nelson assumiu a liderança do campeonato, com 22 pontos, um a mais que Arnoux.

Antes do Grande Prêmio da Espanha estourou a "guerra” entre a Federação Internacional do Esporte do Automóvel (FISA) e a Associação dos Construtores da Fórmula 1 (FOCA), cada qual defendendo seus conflitantes interesses. A corrida de Jarama aconteceu sem a presença das equipes Renault, Ferrari e Alfa Romeo, porque foi declarada ilegal pela FISA. Laffite, Jones, Pironi, Reutemann, Piquet e Prost largaram na frente do conturbado GP da Espanha. Foi uma corrida cheia de imprevistos e acidentes, com Jones chegando na frente, seguido por Mass, De Angelis e Jarier. Nelson teve a caixa de câmbio quebrada quando liderava a corrida, com grandes chances de vencer. Mas não teria adiantado vencer, pois os pontos da corrida de Jarama foram anulados, beneficiando Nelson, que manteve a liderança do campeonato.

A Ferrari apresentou na Itália seu novo carro, equipado com motor turbocomprimido, o modelo 126, cujos testes começaram a ser feitos no dia 11 de junho na pista particular da fábrica italiana, em Fiorano. A Alfa Romeo já havia anunciado sua decisão de aderir aos motores desse tipo e a Brabham também anunciava a mesma medida. Seus carros poderiam ser equipados com os motores alemães BMW.

Durante um treino especial em Brands Hatch, do qual participaram vários pilotos, Nelson Piquet viu a morte de perto quando bateu violentamente no guard-rail, destruindo totalmente seu Brabham. Pouco antes Patrick De-pailler também batera forte. As pessoas que viram os acidentes e o estado em que ficaram os carros não conseguiram entender como os pilotos saíram vivos. A causa dos acidentes foi excesso de impetuosidade, pois desde o início dos treinos havia prenúncios de que alguma coisa grave poderia acontecer, tal a velocidade que os pilotos imprimiram em seus carros, principalmente depois que Didier Pironi conseguiu a façanha de bater o recorde do circuito, pertencente a Alan Jones, baixando-o em mais de dois segundos. Entusiasmados com o tempo de Pironi, os demais "baixaram a bota", na tentativa de virar mais rápido que o francês, parecendo inconseqüentes pilotos de Fórmula 3.

As grandes decepções da temporada vinham sendo a Lotus e a Ferrari. O desempenho das duas mais tradicionais equipes da Fórmula 1 vinha sendo medíocre, comparado ao das duas temporadas anteriores, nas quais se tornaram campeãs. No GP da França o melhor que a Lotus conseguiu foi o 12º lugar do grid, com Mario Andretti, enquanto Elio De Angelis ficava em 14º. A Ferrari estava ainda pior: Villeneuve em 17º e Scheckter em 19º. Nem mesmo Nelson foi bem nos treinos em Paul Ricard. Com problemas de câmbio não passou do oitavo tempo no grid, atrás de Laffite, Arnoux, Pironi, Jones, Reutemann, Jabouille e Prost. A corrida acabou sendo vencida pelo australiano Alan Jones, que estragou a festa dos franceses, que conseguiram os segundo e terceiro lugares, com Pironi e Laffite. Nelson ficou em quarto.

Encerrada a primeira fase do campeonato delineava-se um clima de rivalidade, criado pela imprensa, envolvendo os dois primeiros colocados no campeonato: o australiano Alan Jones (com 28 pontos) e o brasileiro Nelson Piquet (com 25 pontos). Analisando a situação das demais equipes chegou-se à conclusão que o título seria mesmo disputado entre esses dois pilotos. A Renault, que assustou no início da temporada, continuava sofrendo com a fragilidade de seus motores. A Ligier se caracterizava pelo azar ou por falhas do equipamento nos momentos mais decisivos. Ferrari e Lotus estavam afastadas do páreo. O favoritismo apontava os dois pilotos e todas as atenções convergiram para o Williams nº 27 e o Brabham nº 5.

Ricardo Zunino foi dispensado por Bernie Ecclestone, cedendo o posto de segundo piloto da Brabham ao milionário mexicano Hector Rebaque, de 24 anos. Ligeiramente melhor que Zunino, Rebaque estava afastado das pistas há alguns meses e estrearia na Inglaterra. Nelson continuaria sem um segundo piloto capaz de ajudá-lo num momento tão decisivo como o que se iniciaria a partir da segunda fase do campeonato.

O "primeiro round'' da luta Jones x Piquet estava marcado para Brands Hatch, Inglaterra. Didier Pironi estabeleceu a pole-position, Laffite ficou em segundo, seguido das Williams de Jones e Reutemann e da Brabham de Piquet. Confirmando as previsões Jones venceu, com Nelson chegando em segundo. Ninguém mais tinha dúvidas: Um dos dois seria campeão do mundo.

Hockenheim seria o palco do GP da Alemanha. O rápido e perigoso circuito alemão, onde perdeu a vida o legendário Jim Clark, mais uma vez se encarregou de entristecer o alegre circo da F-1 com a morte de Patrick Depailler. O piloto francês treinava com seu Alfa Romeo na semana anterior à realização da corrida quando perdeu o controle de seu carro e bateu a cerca de 250 km/h. Depailler teve praticamente arrancadas as pernas, seccionadas um pouco acima do joelho, além de fratura do braço direito e do crânio, chegando praticamente morto na clínica Heidelberg, em conseqüência da forte hemorragia em decorrência dos graves ferimentos. A Fórmula 1 e a França perdiam um dos profissionais mais completos da história.

Alan Jones registrou a pole-position na Alemanha, seguido por Jabouil-le, Arnoux, Reutemann, Laffite e Piquet. Nelson estava satisfeito com o sexto tempo dos treinos. "Tudo foi bem no treino, nada me atrapalhou. Não fui melhor porque os outros foram mais rápidos, só isso". E Gordon Murray se mostrava bastante confiante: "Espero uma boa corrida. O Nelson é bom e o carro está perfeitamente regulado. Tudo dependerá do andamento da corrida". O resultado do GP da Alemanha foi razoável para Nelson. Ele chegou em quarto, atrás de Laffite, Reutemann e do rival Jones. Com esse resultado o australiano ampliou mais sua vantagem, passando a somar 41 pontos, contra 34 do brasileiro.

Em Zeltweg, Áustria, Nelson bateu forte com o BT-49 no guard-rail da curva Boch. O carro ficou totalmente destruído, inclusive com uma roda dianteira ficando bem junto do volante. Felizmente o piloto nada sofreu. As Renault de Arnoux e Jabouille saíram na frente, seguidas pelas Williams de Jones e Reutemann, das Ligier de Laffite e Pironi e da Brabham de Piquet. Faltava muito pouco para a Brabham se igualar e mesmo superar as três marcas e a equipe se empenhava na busca de uma solução. Nelson conseguiu chegar em quinto lugar, correndo sem embreagem, atrás de Jabouille, Jones, Reutemann e Laffite. Seria difícil superar Williams, Ligier e Renault. No campeonato Piquet ficou a 11 pontos de Jones e apenas 6 à frente de Reutemann.

Para superar as principais concorrentes a Brabham precisava de uma modificação técnica inovadora, eficaz. E urgente. A solução veio com uma nova suspensão dianteira, mais elástica que a anterior, que tinha provocado o desgaste prematuro dos pneus em Zeltweg. Murray esperava, com essa inovação, manter Nelson na luta pelo título. A Brabham estava mesmo disposta a se tornar uma equipe campeã. E já investia no futuro: estava preparando o modelo BT-50, equipado com motor BMW turbo.

Renault e Williams registraram os melhores tempos nos treinos do GP da Holanda. Nelson era o quinto. Mesmo largando nesta posição o brasileiro era o favorito. Seu desempenho vinha sendo ótimo e as demais equipes sentiam a evolução da Brabham. Nelson elogiou o carro: "A aderência melhorou muito com a nova suspensão. Isso é fundamental num circuito como Zandvoort, onde a corrida depende das saídas de curvas. Nossos pneus também são bons e isso será decisivo ". E veio o resultado do árduo e objetivo trabalho que Nelson vinha desenvolvendo com Gordon Murray. Com uma atuação consciente e madura, Nelson venceu o GP da Holanda. E o que foi ainda melhor: Jones não marcou pontos. Arnoux foi o segundo e Laffite o terceiro. Com esse resultado Nelson ficou a apenas dois pontos de Jones.

A dupla Piquet/Murray passou a ser mais respeitada do que nunca no circo da F-l, Murray atribuía a Nelson o mérito do excelente desenvolvimento do BT-49, depois de exaustivos testes em Silverstone. "O carro deverá se tornar mais estável. Esperamos em Ímola conseguir uma atuação semelhante a Zandvoort. O Piquet tem grandes chances de vencer o Campeonato Mundial". Mesmo com a perspectiva do título Nelson se mantinha distante. Não admitia a condição de favorito e não falava de seus planos para o futuro. Muitos jornalistas afirmavam que seu estilo era uma mistura de "um pouco de Pace e um pouco de Emerson". Também fugia de qualquer comparação com Emerson Fittipaldi e costumava dizer: “Ele fez muito pelo automobilismo brasileiro e agora atravessa uma fase difícil. A imprensa faz injustiças com ele". Humilde, afirmava que futuras vitórias não mudariam sua maneira de pensar e agir. "Apenas sou o que sou. Corro porque gosto. Sou uma pessoa simples e quero continuar assim".

Alan Jones x Nelson Piquet. Nesse grande duelo pelo título mundial havia um ponto comum entre os dois pilotos: o respeito. Nelson dizia que "o Jones é um adversário difícil para qualquer um, capaz de se distinguir em todas as circunstâncias''. Jones, por sua vez, afirmava que "o Piquet é o rival mais perigoso e o piloto mais interessante da nova geração". E Ímola seria o "round" seguinte.

O GP de San Marino foi muito disputado desde os treinos. As frágeis Renault de Arnoux e Jabouille registraram os melhores tempos, seguidas da Williams de Reutemann e da surpreendente Alfa Romeo de Giacomelli. Logo atrás Piquet e Jones, na mesma fila. A verdadeira rivalidade entre o australiano e o brasileiro se acirraria a partir do final da corrida de Ímola. Nelson venceu e Jones ficou em segundo, com o brasileiro assumindo a liderança, um ponto de vantagem sobre Jones. Mesmo com a rivalidade os dois eram cautelosos em suas declarações. Nelson afirmava: "Se vou ganhar o título não sei. Ainda faltam duas corridas. Vou disputá-las e o resultado saberemos depois". Jones dizia: "Um ponto de vantagem não quer dizer nada. Ainda têm duas corridas. Perdi aqui porque fiquei sem freios nesse circuito horrível".

Na verdade Nelson Piquet venceu Alan Jones duas vezes no mesmo fim de semana. O piloto brasileiro venceu a prova da série Procar, disputada com os carros BMW Mach 1. Essas corridas eram disputadas aos sábados depois dos treinos oficiais de cada GP. Com essa vitória em Ímola, a terceira no Torneio, Nelson sagrou-se campeão do Campeonato BMW-Procar. Jones foi o segundo na prova.

Os carros de Piquet e Jones pareciam nivelados em performance. Restava saber as condições psicológicas de cada um. A situação de Jones parecia dramática. Aos 34 anos o australiano tinha a consciência de que dificilmente teria uma oportunidade tão boa de conquistar o título de campeão mundial. Apesar de experiente Jones não mostrava a mesma tranqüilidade que o caracterizava até antes do GP da Holanda. A ascensão de Nelson e sua própria queda o deixaram um pouco perturbado e inseguro. Quanto a Nelson o comprometimento era bem menor. Aos 27 anos tinha ainda uma longa carreira pela frente e, colocado na posição de "desafiante" como estava, esperava pelo título como "lucro" e aceitaria a sua perda normalmente. Extremamente frio nessas ocasiões e uma conduta quase que linear Nelson não se deixava envolver por influências externas. Sempre teve uma estrutura interior muito forte.

O Grande Prêmio do Canadá foi cercado de grande expectativa. Nos treinos de sexta-feira, sob chuva, Alan Jones faz o melhor tempo enquanto Nelson ficava em sexto. No sábado, com um desempenho espetacular, Nelson registrou a pole-position, com o tempo de 1'27"328, contra 1'28"164 de Jones, o segundo colocado.

Com os dois candidatos ao título na primeira fila a emoção estava garantida. A largada de Jones foi ligeiramente melhor que a de Piquet, com o brasileiro largando por dentro e com a preferência para a primeira curva, que seria para a direita. Ocorreu que Jones foi gradativamente imprensando Piquet contra o muro de proteção até que as rodas de seus carros se tocaram. O carro de Nelson rodou, bateu contra o muro, e foi abalroado por Keke Rosberg. Pironi também bateu levemente em Nelson, atravessou a pista e foi colhido pelos Tyrrell de Jarier e Daly. Bateram ainda Andretti, Villeneuve e Emerson. Com a pista praticamente bloqueada a prova foi paralisada. O fato de Jones provocar o acidente ficou evidente. Restava saber se tinha sido intencional ou não. A Brabham oficializou um protesto enquanto Nelson e outros pilotos que se envolveram no acidente preparavam seus carros reserva para uma nova largada.

Depois de 55 minutos de paralisação aconteceu a segunda largada. Foi emocionante. Pironi e Jones foram mais rápidos que Piquet e pularam na frente. Mais adiante Jones superou Pironi e assumiu a liderança. Na segunda volta Nelson também ultrapassou Pironi e partiu em perseguição a Jones. Mais uma volta e tomou a liderança do australiano. Daí por diante, com atuação perfeita, Nelson foi aumentando a vantagem volta a volta. Na 23ª volta o brasileiro viu as chances de se tornar campeão mundial acabarem com o motor do Brabham estourado. A partir desse ponto a corrida perdeu a graça e se resumiu à perseguição de Jones por Pironi. O francês superou o australiano e cruzou a linha de chegada na frente. Porém, Pironi foi penalizado em um minuto por ter queimado a largada. Tudo correu a favor de Jones, que conquistou o título de campeão mundial de 1980. Durante a corrida aconteceu um grave acidente com Jean Pierre Jabouille, que bateu de frente no guard-rail com seu Renault, fraturando as duas pernas. Apesar de se recuperar bem dos ferimentos e tentar retornar às corridas, esse acidente determinaria o encerramento da carreira do excelente piloto francês.

Depois da corrida Nelson disse em várias entrevistas que Jones foi causador do acidente da primeira largada afirmando que "o Jones quis me tirar da corrida. Mas não tem importância. Ele mereceu o título porque é bom piloto. Em 81 eu serei o campeão". Era um desafio que Nelson lançava, talvez para si mesmo, mostrando o que já vinha sentindo em relação ao título de 80. Provavelmente até já o considerasse ganho quando liderava a prova.

Na última corrida da temporada, em Watkins Glen, Estados Unidos, Nelson queria a vitória, chegando a afirmar: "Será ótimo encerrar o campeonato com uma vitória". Isso ofuscaria o brilhantismo de Jones. Fez o segundo melhor tempo, atrás do surpreendente Giacomelli e sua Alfa Romeo. Os planos de Nelson não deram certo. Jones venceu novamente. Era mesmo o ano do australiano e da Williams.

por Luiz Carlos Lima

2 comentários:

Samuel disse...

Gostei do texto, muito bom

Anônimo disse...

Essa semana postaremos um sobre a temporada de 1981. Vamos ver se conseguimos resumir até a temporada de 1990.